JP Morgan: Brasil perto do ‘muro fiscal’ com risco de fuga de investimentos

Economista do JP Morgan alerta que Brasil se aproxima de um “muro fiscal”. Entenda os riscos e o impacto para investidores com o cenário eleitoral.
risco fiscal Brasil — foto ilustrativa risco fiscal Brasil — foto ilustrativa

O Brasil atingiu seu limite de gastos e o próximo governo não terá espaço para expansão fiscal, alertou Cassiana Fernandez, economista-chefe para Brasil no JP Morgan. O risco de o país perder a confiança dos investidores em sua capacidade de honrar a dívida pública é iminente, o que poderia levar à fuga de capitais.

“Sabemos que caminhamos para o muro. Vamos esperar bater nele ou mudar a rota antes?”, questionou Fernandez em Entrevista exclusiva. Ela ressaltou que, mesmo em um ano eleitoral, a falta de espaço fiscal impede o aumento de gastos públicos.

Fernandez destacou que os ativos preferidos pelos investidores globais atualmente são o ouro e ações de companhias americanas. Embora haja menos preocupação com uma bolha na Inteligência Artificial (IA), a demanda crescente por ouro sugere um cenário de cautela.

Sentimento Global e Inflação

A percepção dos investidores sobre a conjuntura global mudou. Preocupações com tarifas comerciais entre Estados Unidos e China e a inflação persistentemente alta têm gerado apreensão. Em contrapartida, bancos centrais na América Latina têm adotado uma postura mais cautelosa.

A Inteligência Artificial é vista como um motor de mudança estrutural, mas seu impacto econômico e temporal ainda é incerto. O setor privado demonstra forte demanda por investimentos em IA, o que impulsionará a necessidade de energia. Analistas buscam identificar os beneficiários e os prejudicados nessa nova dinâmica tecnológica.

IA e Valorização de Ativos

A preocupação com uma bolha especulativa em torno da IA é menor entre os investidores, que mantêm um viés construtivo sobre seus impactos. A incerteza reside em como a tecnologia afetará a produtividade, as variáveis macroeconômicas, a inflação e o consumo de energia. Ouro e ações americanas despontam como os ativos com maior potencial de valorização no curto prazo.

No entanto, a própria demanda elevada por ouro sugere um grau de ceticismo, por ser um ativo considerado conservador. A oferta limitada de ouro reforça a percepção de risco, mais do que um receio exagerado de inflação. Jamie Dimon, CEO do JPMorgan Chase, projeta que o metal precioso possa atingir valores significativamente mais altos.

Políticas de Trump e o Dólar

A projeção de crescimento para os Estados Unidos tem sido consistentemente revista para cima. Investidores demonstram maior receio com a possibilidade de uma aceleração econômica gerar pressões inflacionárias do que com uma desaceleração abrupta. A percepção sobre a Europa também mudou, com um ceticismo crescente em relação ao potencial de gastos fiscais e às implicações para o crescimento, além de problemas estruturais como a regulação.

A política de tarifas de Donald Trump levanta questionamentos sobre o novo equilíbrio comercial. Estima-se que a tarifa média de importação dos EUA possa atingir cerca de 20% ao final do mandato, um impacto que deve se refletir nos preços. A incerteza sobre a forma como isso se dará, especialmente com restrições internas e decisões da Suprema Corte, é o principal ponto de atenção.

O consenso é que o dólar continuará a se enfraquecer, embora em um ritmo mais lento. Para países emergentes, isso significa que o benefício de moedas mais apreciadas e, consequentemente, uma desinflação mais rápida, tem um limite. Embora o apetite por investir em mercados emergentes permaneça, ouro e ações americanas são as apostas principais.

Brasil e o Cenário Fiscal

Cassiana Fernandez atribui o bom desempenho da moeda brasileira a uma combinação de sorte e boas políticas, destacando a postura conservadora do Banco Central (BC). Cerca de 65% do resultado positivo do real é atribuído a fatores globais, e 35% a elementos idiossincráticos do Brasil.

Enquanto investidores domésticos analisam o Brasil em profundidade, os estrangeiros o comparam com outros países, muitos dos quais enfrentam deterioração fiscal. Mesmo nos EUA, há preocupações com o impacto do pacote fiscal na trajetória da dívida pública.

Fernandez discorda da visão de que o Brasil enfrenta risco iminente de crise fiscal. Segundo ela, o país já atingiu o limite de expansão fiscal. A principal preocupação é a perda de confiança na capacidade do governo de honrar a dívida, o que desencadearia fuga de capitais. Um ajuste fiscal significativo é inevitável para estabilizar a dívida, atualmente próxima de 80% do PIB.

A polarização política dificulta o ajuste fiscal, pois qualquer reforma precisa passar pelo Congresso Nacional, onde propostas podem ser diluídas. O cenário ideal seria um ajuste que promovesse crescimento acelerado e sustentável.

Preocupações do Investidor Estrangeiro

A dinâmica da dívida pública é uma preocupação recorrente para investidores estrangeiros no Brasil. Apesar do desempenho positivo recente, o potencial de crescimento do país permanece baixo em comparação com outras economias emergentes. A piora no déficit em contas correntes e a questão geopolítica, incluindo a reação do Brasil a tarifas mais altas, também estão no radar.

A comunicação dos diretores do BC nas reuniões do FMI foi consistente, reforçando a mensagem de que as condições ainda não permitem afrouxar o aperto monetário. A desaceleração econômica observada ainda não é suficiente para aliviar as pressões inflacionárias.

O risco de crédito privado também foi destaque, com a observação de que quanto mais alta a taxa de juros, maior a necessidade de acompanhamento da dosagem do remédio para não desaquecer excessivamente a economia e reduzir as pressões inflacionárias.

Os balanços corporativos brasileiros preocupam, com margens de lucro sob pressão e dificuldades financeiras para empresas mais alavancadas. Este cenário representa um risco para a economia brasileira, especialmente em 2026, caso a volatilidade do mercado se intensifique.

Relações Brasil-EUA e Argentina

O impacto das tarifas impostas pelos EUA sobre a atividade brasileira é considerado pequeno. A retaliação, que foi evitada pelo governo brasileiro, seria mais prejudicial ao país. Observa-se uma desescalada nas tensões com os EUA e iniciativas para retomar o diálogo, embora ainda em estágio inicial.

Na Argentina, o otimismo com a política econômica é cauteloso, com um ajuste fiscal rápido, mas com a necessidade de perseverar em reformas estruturais para atrair investimento privado. O resultado das eleições primárias é crucial para a continuidade das políticas de ajuste.

O apoio dos Estados Unidos tem sido fundamental para a Argentina, especialmente após a eleição na província de Buenos Aires, que gerou temores sobre a capacidade do governo de implementar suas políticas. A solução para os dilemas argentinos passa pela atração de investimento direto estrangeiro para honrar o endividamento externo e aumentar o PIB.

Em relação a eleições na América Latina, investidores mostram-se mais cautelosos. Há um otimismo construtivo em relação ao México, apesar de incertezas sobre o acordo USMCA. No Brasil, o alto nível da taxa de juros é um ponto positivo, mas a polarização eleitoral afugenta investidores.

Fonte: Estadão

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