Agronegócio: BB defende colchão financeiro para cobrir anos de crise

Vice-presidente do BB defende que agronegócio crie reservas financeiras para superar anos de crise, com foco em planejamento de longo prazo.
Reservas financeiras agronegócio — foto ilustrativa Reservas financeiras agronegócio — foto ilustrativa

A autorização do Governo para a renegociação de dívidas rurais oferece um alívio temporário a produtores em dificuldades. No entanto, uma solução sustentável para o agronegócio exige um planejamento de médio e longo prazo, com foco na criação de reservas financeiras para períodos de instabilidade, segundo Gilson Bittencourt, vice-presidente de agronegócios e agricultura familiar do Banco do Brasil (BB).

“Tem produtor que faz muito bem as contas, mas numa visão muito de receita e despesa do ano. Mas como isso vem ao longo do tempo? Há um debate que precisa ser feito: como anos bons geram algum tipo de colchão para anos ruins? Se todo mundo sabe que é cíclico”, afirmou em Entrevista.

Bittencourt destacou que o recente período de prosperidade no campo, impulsionado pela alta das commodities durante a pandemia, viu muitos produtores reinvestirem seus lucros na aquisição de terras ou em outras atividades, resultando em menor capital próprio disponível para a lavoura. Essa imobilização de recursos e a demanda adicional de custeio deixaram muitos expostos à Falta de liquidez em momentos de aperto no fluxo de caixa.

“O produtor passou a ter um menor capital próprio para a sua própria lavoura. Na hora que aperta o fluxo de caixa, não tem liquidez. Ele não consegue trazer de forma rápida, seja por decisão, tem muita gente que não quer se desfazer [do bem], ou mesmo quando quer não consegue de forma rápida. Então, parte importante deles [dos inadimplentes], se não a maioria absoluta, eram produtores que historicamente eram adimplentes”, explicou.

Produtor rural inspeciona plantação, mostrando a importância do agronegócio no Brasil.
A criação de reservas financeiras é crucial para a sustentabilidade do agronegócio.

O executivo ressaltou a importância de mecanismos que incentivem os produtores a poupar parte dos lucros obtidos em anos prósperos. Essa reserva funcionaria como um “colchão” para amortecer perdas futuras, reduzindo a dependência exclusiva de instrumentos de seguro.

“Seguro é fundamental, quanto mais tiver, melhor. Agora, como faço com que o produtor tenha mais essa responsabilidade? Um ano está bom? Como que eu guardo uma parte disso? Pelo processo de que, na frente, eu posso ter algumas dificuldades”, ponderou.

Impacto da Taxa Selic e Risco Moral

As dificuldades financeiras de parte dos produtores foram agravadas pelo aumento da taxa Selic, que elevou o custo do crédito, e pela própria expectativa de renegociação de dívidas, que teria gerado um risco moral, levando alguns a se tornarem inadimplentes antecipadamente.

Adicionalmente, projeções otimistas sobre a continuidade de preços elevados de commodities levaram à celebração de contratos de arrendamento de terra com base em expectativas de renda infladas, que agora pesam nos custos de produção. O vice-presidente do BB, que anteriormente atuou como subsecretário de Política Agrícola no Ministério da Fazenda, comentou sobre essa percepção equivocada.

“Não é que os preços estão caindo. Os preços estão voltando ao patamar [histórico]. O que foi fora da curva foi aquele boom. Então, houve também uma expectativa equivocada de muita gente, seja produtor, seja Técnico do campo. Em alguns casos, até das instituições financeiras. Houve uma expectativa de que aqueles preços e aquela margem de ganho seriam permanentes”, analisou.

Gráfico de barras com dados financeiros do agronegócio brasileiro.
A inadimplência no crédito rural do Banco do Brasil mais que dobrou em um ano.

Renegociação e Linhas de Crédito

A inadimplência no crédito rural do Banco do Brasil atingiu 3,5% da carteira no segundo trimestre de 2025, mais que o dobro do registrado no mesmo período do ano anterior (1,3%). Esse índice é ainda maior quando se consideram apenas os produtores cujas terras são arrendadas, chegando ao dobro do índice geral, afetando regiões como Rio Grande do Sul, Mato Grosso e São Paulo.

O BB disponibilizará pelo menos R$ 4,3 bilhões para a linha de crédito subsidiado, o que representa cerca de um terço do total do Tesouro Nacional, com previsão de atender até 20 mil produtores. Esta linha é restrita a municípios que decretaram calamidade ou emergência devido a fenômenos climáticos e que registraram perdas significativas na produção.

Além da linha subsidiada, o BB estima emprestar outros R$ 20 bilhões com recursos livres, com taxas pré-fixadas entre 16,65% e 19% ao ano. Uma novidade é a oferta de uma linha pós-fixada, atrelada ao CDI, que começa em CDI + 2,9% ao ano. Essa modalidade visa repassar ao produtor os ganhos com a esperada queda da taxa Selic.

Sede do Banco Central do Brasil em Brasília, onde decisões sobre crédito rural são discutidas.
O Banco Central avalia critérios para que renegociações de dívidas sejam consideradas operações de crédito rural.

Impasse com o Banco Central

Um impasse com o Banco Central (BC) sobre a classificação de renegociações de dívidas como operações de crédito rural pode afetar o direcionamento de recursos captados por meio de fontes mais baratas, como a LCA (Letra de Crédito do Agronegócio). O BC demonstra receio de que empréstimos pessoais utilizados para quitar dívidas rurais sejam considerados para cumprir os critérios de direcionamento.

O Banco do Brasil, juntamente com outras instituições, pleiteia que o BC verifique a proporção de cada tipo de operação para permitir que, ao menos a parcela originada de crédito rural, seja considerada para fins de direcionamento. Essa medida é vista como essencial para que o spread bancário cubra os custos operacionais sem onerar excessivamente o tomador.

Fonte: Folha de S.Paulo

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