Um abaixo-assinado com mais de 70 mil assinaturas, idealizado pela advogada Marina Pinhão Coelho Araújo, vice-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), clama por maior diversidade no Supremo Tribunal Federal (STF), defendendo a indicação de mulheres para a corte. A iniciativa busca combater o que Araújo define como um “déficit democrático” nas decisões do tribunal.
O STF, em toda a sua história, contou com apenas três ministras: Ellen Gracie, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Dessas, apenas Cármen Lúcia permanece em exercício, com Aposentadoria prevista para 2029. A advogada argumenta que a atual composição, majoritariamente masculina e homogênea em termos de classe social e idade, não reflete a diversidade da sociedade brasileira, impactando a legitimidade e a proximidade das decisões judiciais com a realidade do país.
A Campanha por Representatividade Feminina
A campanha ganhou força após a antecipação da Aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso. Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não tenha definido o sucessor, as especulações apontam para nomes masculinos. Esta seria a terceira indicação de Lula ao STF em seu mandato atual; anteriormente, ele nomeou Flávio Dino para a vaga de Rosa Weber e Cristiano Zanin, seu advogado pessoal, para a de Ricardo Lewandowski. O movimento de Marina Araújo visa sensibilizar o governo sobre a importância da diversidade de gênero nas futuras indicações.
“A gente precisa entender da presidência qual tem que ser o movimento para ter mulheres viáveis nesse papel. Não estamos sugerindo nenhum nome específico. É um movimento amplo pela questão do gênero”, explica Araújo. O grupo reconhece que a indicação para a vaga de Barroso pode não resultar na escolha de uma mulher, mas planeja buscar diálogo com o Planalto após a decisão ser formalizada, visando as próximas oportunidades.
Avanços e Desafios para a Diversidade no Judiciário
A advogada enfatiza que a articulação para a inclusão de mulheres no STF não pode ocorrer de última hora, mas sim como um processo contínuo. A proposta é aproximar o pleito da Presidência da República e entender como tornar candidaturas femininas viáveis. “A gente precisa entender da presidência qual tem que ser o movimento para ter mulheres viáveis nesse papel”, reitera. A campanha, segundo ela, não é direcionada contra nomes específicos como Jorge Messias ou Rodrigo Pacheco, mas sim um movimento mais amplo pela equidade de gênero. Acredita que o presidente Lula não é avesso à pauta, mas que o diálogo é mais produtivo em momentos de menor tensão.
Além da questão de gênero, o movimento também busca ampliar a discussão para a representatividade racial. “Nós nunca tivemos uma mulher negra no STF”, lamenta Araújo, destacando que as mulheres negras são a base da sociedade brasileira e que é preciso corrigir essa dívida histórica. A indicação de ministras negras para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é vista como um sinal positivo de que essa pauta está ganhando atenção.
Apesar da única ministra em exercício, Cármen Lúcia, representar menos de 10% da corte, Araújo se mostra otimista quanto à possibilidade de aumento da presença feminina. Ela compara a situação brasileira com a de cortes internacionais, como a americana e a alemã, onde a representatividade feminina é significativamente maior. Acredita que o presidente, que obteve apoio expressivo do eleitorado feminino em 2022, tem consciência da necessidade de ampliar a participação de mulheres no STF. Medidas administrativas aprovadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para assegurar a paridade de gênero no Poder Judiciário são vistas como um passo importante, que pode, gradualmente, influenciar a composição de instâncias superiores.
O Papel do STF e a Legitimidade Democrática
Araújo ressalta que a demanda do movimento não é por alteração nos critérios de nomeação para o STF, que já preveem notório saber jurídico e reputação ilibada. Acredita que a diversidade de gênero e racial no tribunal aumenta a legitimidade das decisões, pois reflete a pluralidade da sociedade brasileira. Quando o STF é composto por uma variedade de perfis, as decisões tendem a ser mais justas e próximas da realidade, garantindo a defesa dos direitos fundamentais.
“Se eu tiver uma juíza mulher, um juiz homem e um juiz negro, ou uma juíza negra, as decisões vão ser muito mais legítimas porque vão ter vários olhares e dali saem decisões que são muito mais próximas do que a sociedade é”, argumenta. A falta de representatividade, especialmente no que diz respeito às mulheres, que compõem mais da metade da população brasileira, escancara um déficit de legitimidade, pois são majoritariamente homens decidindo sobre a vida de toda a nação.
A advogada confessa não saber explicar completamente por que a representatividade feminina no STF é tão baixa historicamente, em uma sociedade que, apesar de patriarcal, tem apresentado avanços. Contudo, ela expressa otimismo, acreditando que movimentos como o que lidera, somados à crescente conscientização sobre a importância da diversidade, podem, em longo prazo, transformar essa realidade e oxigenar o sistema judicial brasileiro.
Fonte: Estadão