O uso intensivo de medidas provisórias (MPs) evidencia um desequilíbrio entre urgência política e responsabilidade institucional. Criadas pela Constituição de 1988 e alteradas em 2021, as MPs visavam permitir ação imediata do Executivo em situações urgentes, com o aval do Congresso Nacional. Contudo, a prática tem mostrado uma banalização desse instrumento.
Setor Energético Sob Risco de Medidas Provisórias
Nos últimos meses, o setor energético tem sido alvo frequente. Reformas de grande impacto, que necessitam de amplo debate, têm sido tratadas de forma superficial. Exemplos disso são as MPs n.º 1.300 e n.º 1.304, ambas de 2025, que alteram pilares fundamentais do setor elétrico brasileiro.
O prazo de 120 dias para as MPs reduz a qualidade do debate e distorce prioridades. Questões complexas são simplificadas para decisões de ocasião, aprovadas sob pressão política. Essas medidas, na prática, não abordam apenas questões imediatas, mas também projetam necessidades de médio e longo prazo que impactarão o sistema como um todo.
A MP n.º 1.318/2025, que cria o Regime Especial de Tributação para Serviços de Datacenter (Redata), segue a mesma linha. Em vez de uma abordagem estratégica sobre a integração entre política industrial, infraestrutura digital e transição energética, o Governo avança rapidamente na aprovação de um tema crucial para a competitividade nacional, tratando-o como um mero ajuste contábil.
Impacto na Previsibilidade e Investimento
Essa legislação de urgência “permanente” afeta diretamente a previsibilidade em setores de alto investimento, como energia e tecnologia. Empresas hesitam em investir, agências reguladoras perdem autonomia e o debate público torna-se refém da pauta momentânea.
Componente Político e Eleições de 2026
A proximidade das eleições de 2026 é um fator político evidente. O Executivo tem pressa em aprovar medidas com apelo popular, como a expansão da tarifa social, sem enfrentar temas mais complexos que exigem discussão aprofundada. Essa estratégia prioriza ganhos eleitorais imediatos em detrimento da consistência técnica e credibilidade institucional.
Incerteza e Planejamento de Longo Prazo Comprometidos
Em última análise, o Brasil enfrenta o custo da incerteza. O excesso de MPs desorganiza o planejamento de longo prazo e transforma o setor energético em um campo de testes improvisado. Para se consolidar como potência energética sustentável e previsível, o país precisa resgatar o sentido original da política: planejamento, diálogo e estabilidade. A urgência não deve ser confundida com eficiência, e o futuro do setor energético não pode ser decidido em 120 dias.
Fonte: Estadão