O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta sexta-feira (7) para manter a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado. A Primeira Turma da Corte analisa um recurso contra a condenação de Bolsonaro a mais de 27 anos de prisão, definida em setembro. A análise, que começou às 11h desta sexta e vai até 23h59 do dia 14 de novembro, representa um passo crucial para o desfecho do caso, que pode culminar na determinação para que o ex-presidente cumpra pena de prisão por ter supostamente liderado uma trama golpista. Caso a decisão seja mantida, será a primeira vez na história do Brasil que um ex-presidente da República será preso por tentar romper as estruturas democráticas.
A tendência é que os demais ministros da Primeira Turma, composta por Flávio Dino, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia, acompanhem o relator, Alexandre de Moraes. O ministro Luiz Fux, que foi a voz divergente em um julgamento anterior, pediu para mudar para a Segunda Turma e não participará desta votação.
Voto de Moraes: Liderança na Organização Criminosa
Moraes fundamentou seu voto na comprovação de que Bolsonaro exerceu “a Liderança da organização criminosa armada”, o que teria levado aos atos de 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores do ex-presidente invadiram os edifícios-sede das instituições democráticas. O ministro afirmou que as ações delitivas do ex-presidente resultaram na propagação da narrativa falsa de fraude eleitoral e na tentativa de consumar um golpe de Estado para abolir violentamente o Estado Democrático de Direito.
O ministro rejeitou o recurso, entendendo que a decisão da Primeira Turma não apresentou “contradição ou omissão”. Ele declarou que a autoria delitiva de Jair Bolsonaro foi amplamente demonstrada, especialmente em relação aos atos antidemocráticos de 8/1/2023, e que o acórdão condenatório foi exaustivamente fundamentado pelo Supremo.
“A autoria delitiva de Jair Bolsonaro ficou amplamente demonstrada com relação aos atos antidemocráticos praticados em 8/1/2023, tendo sido exaustivamente fundamentada por esta Suprema Corte, não havendo qualquer omissão e contradição no acórdão condenatório proferido por esta Suprema Corte”, disse Moraes.
Moraes também descartou os argumentos de cerceamento de Defesa durante o julgamento. A defesa do ex-presidente alegou que o ministro deveria ter autorizado a participação dos advogados nos interrogatórios de outros núcleos da trama golpista, por serem crimes interligados. O ministro rejeitou essa tese, afirmando que o acórdão condenatório já havia abordado a preliminar de cerceamento de defesa e a rejeitado pela ausência de prejuízo às defesas.
Outro ponto negado por Moraes foi a suposta nulidade da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tema que já havia sido decidido em setembro. O ministro considerou que o recurso tentava, por via inadequada, alterar o resultado do julgamento com a repetição da tese de nulidade, reiterando a validade do acordo de colaboração premiada.
Por fim, Moraes rejeitou o argumento de “desistência voluntária” por parte do ex-presidente. Segundo essa tese, a desistência da execução de um crime implicaria Punição apenas pelo que foi efetivamente praticado. Para Moraes, contudo, ficou demonstrado que o grupo liderado por Bolsonaro cometeu atos ilícitos e executou uma tentativa de golpe de Estado, visando estruturar um golpe e restringir poderes constitucionais.
Condenação em Setembro e Recurso da Defesa
Em setembro, Jair Bolsonaro foi condenado por todos os crimes imputados pela Procuradoria-Geral da República (PGR): organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. A Primeira Turma do STF considerou que Bolsonaro liderou uma organização criminosa que atuou sistematicamente para minar a Confiança da população nas urnas eletrônicas e em instituições como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O objetivo, segundo a acusação, seria criar um ambiente político que facilitasse a deslegitimação de decisões judiciais e questionamentos ao sistema eleitoral caso perdesse a eleição de 2022. Derrotado pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro teria tentado permanecer no poder através de um golpe de Estado.
O recurso da defesa negou que o ex-presidente tenha instigado os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e questionou o uso da delação do tenente-coronel Mauro Cid. A defesa também repetiu a tese de que o crime de tentativa de golpe deveria ser absorvido pelo de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, argumentando que um crime pressupõe o outro, de modo que o acusado deve ser condenado por apenas um deles.
Prisão de Bolsonaro: Destino e Possíveis Cenários
Jair Bolsonaro só cumprirá pena após o STF decretar o trânsito em julgado da ação, quando não cabem mais recursos. O destino dele, no entanto, ainda é incerto, pois nem a Polícia Federal (PF) nem o governo do Distrito Federal demonstraram interesse em recebê-lo em suas instalações. O governo do DF chegou a solicitar a Moraes autorização para uma avaliação médica de Bolsonaro, visando determinar sua condição para ser enviado ao Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. A PF, por sua vez, indicou não possuir local adequado para o cumprimento de penas definitivas.
Ministros do STF, em caráter reservado, descartam a possibilidade de o ex-presidente ficar em instalações do Exército, a fim de evitar proximidade com militares acusados de tramar um golpe e impedir novas mobilizações de apoiadores em quartéis. Segundo a Corte, ex-presidentes condenados ficam em celas especiais separadas, as chamadas “salas de estado-maior”, mas não há obrigatoriedade de que estas fiquem em instalações da PF ou das Forças Armadas.
Os ministros também não descartam a possibilidade de a prisão ser cumprida em regime domiciliar. Em regra, pessoas condenadas a mais de oito anos iniciam o cumprimento da pena em regime fechado. Contudo, após o Judiciário decretar o início da pena, é comum que defesas peçam benefícios como a prisão domiciliar. Diante dos 70 anos de idade e de problemas de saúde de Bolsonaro, essa seria uma possibilidade, segundo fontes da Corte.
Fonte: Valor Econômico