Bebidas ilegais há muito tempo financiam drogas, armas e violência, com a impunidade de seus distribuidores alimentando a engrenagem do crime. O recente episódio envolvendo a comercialização de destilados envenenados com metanol expõe um problema de graves proporções no Brasil: o mercado ilícito de bebidas. Longe de ser um fenômeno marginal, este setor subterrâneo movimentou R$ 56,9 bilhões em 2023, um crescimento de 224% desde 2017. Apenas a sonegação fiscal ligada a essa atividade atingiu R$ 28,2 bilhões no mesmo ano, revelando que o tráfico de bebidas falsificadas ou contrabandeadas é um vetor de esgarçamento social.
A produção e circulação de produtos piratas, embora frequentemente praticadas sem violência direta, causam danos à saúde pública, ao erário e ao tecido comunitário. Muitos consumidores sofrem sequelas permanentes, com internações, comas e, infelizmente, mortes. Os efeitos tóxicos sobre a Confiança social e a economia são devastadores.
O Papel do Direito Penal na Proteção Social
O Direito Penal encontra aqui uma de suas missões mais legítimas: proteger a sociedade de práticas que, pela via clandestina, minam a estrutura do Estado e fortalecem facções criminosas. A organização, o financiamento e o lastro por trás desses mercados indicam que não se trata de algo isolado.
Facções Criminosas e o Controle do Mercado
Facções e milícias estão envolvidas há tempos no Mercado ilícito de bebidas, controlando rotas e distribuindo produtos adulterados. Isso permite que as organizações ampliem seus lucros para financiar o tráfico de drogas e armas, ao mesmo tempo em que monopolizam mercados locais em territórios vulneráveis, onde a presença estatal é frágil. O trânsito comercial desses produtos funciona como um elo essencial na cadeia da criminalidade planejada e faccionada.
Necessidade de Repensar o Tratamento Penal
Se a circulação encontra incentivo na baixa responsabilização criminal ou na leniência do sistema, perpetua-se um ciclo de delitos como contrabando, roubo de cargas e corrupção de agentes. Reprimir severamente a comercialização, a receptação e a revenda é, portanto, atacar os delitos que lhe dão origem. É preciso repensar o tratamento penal, pois a mera apreensão ou penalidade administrativa não são suficientes. A responsabilização deve ser agravada, com sanções proporcionais à gravidade do risco social.
Se o sistema jurídico não impor freios efetivos, continuaremos a assistir à expansão de um mercado que corrói a arrecadação tributária, alimenta facções e põe em risco a vida da população. O episódio do metanol é um alerta: delitos econômicos sem violência aparente ameaçam a sociedade ao corrompê-la por dentro. O Direito Penal existe para impedir que o clandestino se torne a face visível da desordem social.
Fonte: Estadão