Em 2025, quase metade dos leilões federais de rodovias já enfrentou desqualificações de vencedores, levantando preocupações sobre disputas judiciais. Especialistas apontam que essa situação, apesar de indesejada, demonstra um amadurecimento do Mercado e uma redução de riscos antes do início dos projetos. No entanto, há espaço para aprimoramentos que garantam maior segurança jurídica e regulatória.
Recentemente, o Consórcio Rota Agro Brasil foi inabilitado do leilão da Rota Agro (BR-060/364/GO/MT) devido a irregularidades trabalhistas e falhas no seguro-garantia. O grupo, formado por fundos da Reag Trust e da Azevedo & Travassos, havia arrematado a disputa mais acirrada desde 2018. Com a decisão, a Way Concessões, segunda colocada, deverá assumir a gestão.
Uma situação similar ocorreu na Rota da Celulose, que abrange rodovias federais e estaduais em Mato Grosso do Sul. O consórcio da K-Infra e Galápagos foi desclassificado por não apresentar um atestado de qualificação técnica válido. O grupo contesta a decisão na Justiça, após o segundo colocado, liderado pela XP Investimentos, avançar no processo.
Em agosto, a empresa argentina Plus Byte foi impedida de participar do leilão da ponte binacional São Borja-Santo Tomé, que liga Brasil e Argentina. A comissão binacional alegou que a empresa não cumpriu os requisitos de qualificação econômico-financeira, com patrimônio líquido aquém do exigido. Com isso, a CS Infra, subsidiária da Simpar, deve assumir a concessão.
Repetição de Cenários?
A frequência dessas desqualificações lembra fases anteriores de leilões rodoviários que resultaram em concessões problemáticas. Em 2013, a terceira Rodada de certames federais viu metade das seis estradas concedidas enfrentar dificuldades, incluindo relicitações e trocas de controle, em um cenário de instabilidade econômica e política.
Luis Felipe Valerim, sócio do VLR Valerim Advogados, diferencia os momentos. Ele explica que, na década passada, os impasses ocorriam durante a execução dos contratos, enquanto agora os problemas são identificados previamente à assinatura. Isso sugere um progresso no setor nos últimos anos.
“As contestações antes da execução fazem parte do jogo e podem até ser positivas. Se o modelo passa por um teste de estresse e se mantém de pé, sai mais fortalecido”, disse Valerim. Ele adiciona que, embora os editais atuais sejam mais rigorosos para impedir participações indevidas, o principal desafio permanece na fase de execução das obras, onde a judicialização tem crescido.
Diogo Nebias, especialista em contratos de infraestrutura e sócio do Panucci, Severo e Nebias Advogados, reforça que as recentes desqualificações indicam uma atenção maior do poder público à segurança jurídica das concessões. “Apesar de, numa primeira impressão, soarem negativamente, essas decisões têm um objetivo positivo: garantir serviços adequados e evitar disputas futuras”, observou.
Ajustes e Responsabilidades nas Concessões
Dos três projetos com vencedores inabilitados neste ano, apenas a Rota Agro foi conduzida pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). A Rota da Celulose teve sua gestão compartilhada entre os governos federal e de Mato Grosso do Sul, enquanto a ponte binacional foi administrada por uma comissão Internacional.
A ANTT informou que está em processo de revisão das regras de habilitação para os próximos certames. O Ministério dos Transportes enfatiza que as inabilitações são resultado do cumprimento rigoroso dos editais, o que, segundo a pasta, fortalece a segurança jurídica e posiciona o Brasil como um ambiente previsível para investimentos em infraestrutura.
“As inabilitações ocorrem justamente porque os editais são cumpridos de forma estrita, assegurando que apenas empresas com plena capacidade técnica e financeira, que cumpram ao estabelecido no processo licitatório e disponham de garantias válidas, assumam compromissos de longo prazo com o País”, declarou o ministério em nota.
Fonte: Estadão