A Emenda 136 provocou uma transformação completa nas regras de prazos e pagamento dos precatórios. Essa emenda, elaborada com ideias controversas dos devedores, contornou a Constituição, subvertendo a lógica financeira e jurídica. Com a indefinição sobre o pedido de ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) do Conselho Federal da OAB ao Supremo Tribunal Federal (STF), que busca julgamento de mérito e liminar, o sistema de pagamento de precatórios entrou em paralisia.
Há dois meses, precatórios não são pagos, gerando incerteza sobre quando e quanto os credores receberão. Diante da inércia do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Mauro Campbell Marques, interpretou e regulamentou a Emenda, apelidada de “Emenda do Calote”. O Provimento 207, de 30 de outubro, estabeleceu diretrizes prejudiciais aos credores.
Os Tribunais demandarão ao menos 45 a 60 dias para implementar as novas diretrizes do CNJ. Nesse ínterim, credores que necessitam urgentemente dos recursos terão que recorrer ao Mercado secundário. Atualmente, este mercado oferece apenas 15% a 20% do valor nominal dos títulos para antecipação de pagamento, um valor considerado aviltante.
Essas novas regras causam profunda consternação no meio jurídico especializado em precatórios. Diariamente, são atendidas pessoas idosas, aposentados, muitos com problemas de saúde e baixa expectativa de vida, sem qualquer perspectiva de receber um direito estabelecido por lei e pela própria Justiça. Sentem-se desorientados, temendo uma nova perda.
Autoridades federais, como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o vice-presidente Geraldo Alckmin, já se manifestaram publicamente contra a institucionalização desse calote. Mesmo entes que, em última instância, se beneficiarão da emenda – ao dispor de menos recursos e poder gastá-los em outras rubricas – reconhecem que a medida é inconstitucional, injusta e desigual.
Na minha avaliação, nenhum Estado pode se sentir seguro enquanto sua população credora é vítima de tamanha injustiça. Isso é ainda mais grave quando se trata de devedores com dinheiro em caixa e superávit, como a Prefeitura de São Paulo, cujo orçamento é comparável ao de um país como Portugal (embora o conceito de precatório seja genuinamente brasileiro).
Imagine alguém prestes a receber um precatório. Esse recurso era esperado para quitar dívidas, custear tratamentos médicos, reformar a casa, melhorar a vida dos filhos ou simplesmente para realizar viagens e desfrutar da vida. Agora, essa pessoa retorna à estaca zero. Em um momento de vida onde o desencanto e a descrença com as autoridades afetam significativamente a vida de todos, inclusive a perspectiva de vida.
Quantas mais pessoas precisarão falecer para que os entes federativos e as autoridades judiciárias demonstrem sensibilidade e ofereçam, no mínimo, uma liminar até o julgamento do mérito pelo STF? É triste constatar que o país cuja população não pode contar com a celeridade de julgamento da mais alta instância de sua Justiça, nem possui fórum ou representatividade para defender seus direitos.
O Impacto da Emenda 136 nos Credores de Precatórios
A Emenda 136 alterou significativamente o cenário dos precatórios, especialmente para os credores. O texto original, que garantia um fluxo de pagamento mais previsível, foi substituído por regras que geram incerteza e desvalorizam os títulos. O principal ponto de discórdia é a forma como os prazos e as prioridades de pagamento foram redefinidos, beneficiando majoritariamente os entes públicos devedores.
A Posição do STF e o Papel do CNJ
A demora do Supremo Tribunal Federal (STF) em julgar o mérito da ADI apresentada pela OAB contribui para a prolongada incerteza. Enquanto isso, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através do Provimento 207, buscou regulamentar a Emenda 136. No entanto, a interpretação do CNJ, segundo críticos, agrava a situação dos credores, oferecendo poucas alternativas e forçando-os a aceitar condições desfavoráveis no mercado secundário.
Análise de Especialistas e Autoridades
Ministros como Fernando Haddad e autoridades como o vice-presidente Geraldo Alckmin já criticaram abertamente os efeitos da Emenda 136, classificando-a como um “calote” institucionalizado. A percepção geral é que, apesar de financeiramente vantajosa a curto prazo para os entes públicos, a medida fere princípios constitucionais e a justiça social. A Falta de liquidez e a desvalorização dos precatórios afetam diretamente a vida de cidadãos que aguardam por um direito judicialmente reconhecido.
Fonte: Estadão