China: Parceria Comercial Ameaça Indústria Brasileira?

A crescente dependência comercial do Brasil da China pode estar prejudicando a indústria nacional. Especialistas analisam os riscos e as políticas para diversificar a pauta exportadora.
Gráfico ilustrando a produção de soja, com seta indicando crescimento mais rápido do que o processamento na última década, relacionado à relação comercial entre Brasil e China. Gráfico ilustrando a produção de soja, com seta indicando crescimento mais rápido do que o processamento na última década, relacionado à relação comercial entre Brasil e China.

A forte aproximação comercial do Brasil com a China tem gerado um volume Recorde de exportações, impulsionando o superávit do país. No entanto, alguns analistas levantam a preocupação de que essa dependência crescente possa estar prejudicando a indústria nacional.

Entre 2013 e 2023, o Brasil exportou US$ 838,8 bilhões para a China, com mais de 60% desse total composto por soja e minérios. Paralelamente, a China consolidou-se como um centro manufatureiro e tecnológico global, enquanto a indústria brasileira direcionou seu foco para exportações de menor complexidade, segundo Ana Elisa Saggioro Garcia, professora de Relações Internacionais da PUC-Rio.

Gráfico ilustrando a produção de soja, com seta indicando crescimento mais rápido do que o processamento na última década, relacionado à relação comercial entre Brasil e China.
Produção de soja cresceu mais rápido do que o processamento na última década.

Contexto Histórico da Relação Comercial

A relação comercial entre Brasil e China intensificou-se significativamente a partir de 2004, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu a China como uma economia de mercado. Nos cinco anos seguintes, o fluxo comercial triplicou, e em 2009, a China superou os Estados Unidos como o principal comprador de produtos brasileiros.

Em 2024, a China foi responsável por 28% de todas as exportações brasileiras, superando a soma dos seis maiores importadores seguintes. O saldo da balança comercial bilateral, amplamente favorável ao Brasil (US$ 315 bilhões entre 2004 e 2024), contribuiu para a formação de reservas internacionais. Contudo, essa Parceria levanta debates sobre a concentração da pauta exportadora brasileira em produtos de baixo valor agregado.

O ‘Efeito China’ na Indústria Brasileira

Especialistas apontam que a demanda chinesa alterou o perfil exportador do Brasil. Em 2023, 74% das importações industriais brasileiras vindas da China eram de bens de alta e média-alta tecnologia, enquanto apenas 5% das exportações brasileiras para a China se enquadravam nessa categoria. Atualmente, o Brasil exporta para a China principalmente produtos básicos como soja, minério de ferro e petróleo, além de carnes, milho e celulose.

Segundo análise do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), o aumento da participação da China no comércio exterior brasileiro coincidiu com um declínio no Índice de Complexidade Econômica (ICE) do país, que caiu da 23ª posição em 1998 para a 49ª em 2023. A Lei Kandir, ao isentar impostos sobre exportações de commodities, também pode ter incentivado a venda de matérias-primas in natura.

Ana Garcia, da PUC-Rio, destaca que o Brasil perdeu oportunidades de investir em maior capacidade de processamento de grãos e beneficiamento mineral, áreas onde a China tem expandido sua infraestrutura. O Brasil é o maior produtor de soja, mas apenas o terceiro em processamento, atrás de China e EUA.

Políticas Nacionais vs. Relação com a China

Contrariando a ideia de que a China é a causa da desindustrialização brasileira, especialistas como Evandro Carvalho, professor da FGV Direito Rio, e Roberto Dumas, do Insper, afirmam que o problema reside nas políticas econômicas internas do Brasil. A falta de investimento em setores estratégicos, inovação e tecnologia ao longo de duas décadas é apontada como fator crucial.

O governo brasileiro tem buscado reverter esse quadro com iniciativas como o plano Nova Indústria Brasil (NIB), lançado em janeiro de 2024, que prevê investimentos de R$ 300 bilhões até 2026. A entrada de montadoras chinesas de veículos elétricos no país é vista como uma oportunidade para desenvolvimento conjunto, mas especialistas alertam para a necessidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento para evitar um simples aumento da capacidade de montagem.

Dependência e Riscos Futuros

A concentração de quase um terço das exportações brasileiras em um único parceiro comercial, a China, é considerada um risco por economistas. Roberto Dumas compara a situação a uma empresa que concentra 30% de seus negócios em um único comprador, exposta a instabilidades financeiras, políticas ou sanitárias globais.

A China tem investido em autossuficiência, especialmente em segurança alimentar, o que pode reduzir sua dependência de importações brasileiras no futuro. Paralelamente, a possibilidade de um acordo comercial entre China e EUA, com a China voltando a importar soja americana, pode impactar diretamente os produtores brasileiros.

Apesar dos riscos, ex-embaixadores como Marcos Caramuru e Rubens Barbosa ressaltam que a parceria com a China é consolidada e alinhada com tendências globais de busca por novas lideranças e multilateralismo. O Brasil mantém uma política de não alinhamento, negociando com a China sem aderir a projetos como a Nova Rota da Seda, demonstrando autonomia estratégica.

Fonte: G1

Adicionar um comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Imagens e vídeos são de seus respectivos autores.
Uso apenas editorial e jornalístico, sem representar opinião do site.

Precisa ajustar crédito ou solicitar remoção? Clique aqui.

Publicidade