Os dias em que banqueiros distribuíam cartões de visita de bambu em suas bicicletas para promover a sustentabilidade ficaram para trás. A abordagem do setor financeiro em relação às mudanças climáticas passou por uma transformação drástica, com a cúpula COP30 no Brasil marcada pela ausência de executivos de Wall Street nas discussões sobre redução de emissões. Em vez de focar na meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C, o grande capital agora direciona sua atenção para a demanda por fornecimento e segurança energética.
Essa mudança de foco, impulsionada em grande parte por investimentos maciços de empresas de tecnologia em data centers para alimentar o avanço da Inteligência Artificial, está resultando em um fluxo de capital significativamente maior para energia renovável. No entanto, conforme alertam especialistas, esses investimentos ainda não são suficientes para mitigar as piores consequências das mudanças climáticas.
O domínio da Inteligência Artificial e a Transição Energética
“Existe uma grande lacuna” entre o investimento anual atual e os níveis necessários para reduzir materialmente as perdas econômicas futuras causadas por eventos climáticos extremos, como secas, furacões e tempestades, afirma Rahul Ghosh, diretor-gerente e chefe global de Finanças sustentáveis da Moody’s Ratings. Apesar da alta nas alocações de capital para a economia verde e um rali expressivo em ações de energia limpa neste ano, o aumento das temperaturas globais caminha para ultrapassar os 2°C, segundo Aniket Shah, chefe global de sustentabilidade e estratégia de transição do Jefferies.
“Não vamos atingir a maioria das nossas metas de descarbonização”, lamenta Shah. Essa perspectiva é corroborada por Bill Gates, o bilionário filantropo e defensor do clima, que sugere uma mudança de foco. Em um memorando recente, o cofundador da Microsoft defendeu que as negociações climáticas no Brasil deveriam se concentrar em como melhor se adaptar à realidade climática atual e em como melhorar a qualidade de vida das populações.
“Um maior uso de energia é parte essencial da prosperidade”, ressaltou Gates, indicando a necessidade de equilibrar as preocupações ambientais com o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida.
Desafios e novas abordagens financeiras
Executivos que planejam participar da COP30 no Brasil destacam a importância de aprender com os erros de cúpulas anteriores. Daniel Hanna, chefe do grupo de finanças sustentáveis e de transição do Barclays, aponta que o setor financeiro deve ter “mais humildade em relação à dificuldade disso” e focar em onde aplicar esforços para “apoiar a descarbonização”. A prioridade agora é alinhar o financiamento com a transição energética de forma prática e eficaz.
A maioria dos profissionais do setor financeiro presentes no Brasil não participará das negociações principais da COP30 em Belém, mas sim de eventos do setor privado em São Paulo. Um desses eventos é organizado pela Princípios para o Investimento Responsável (PRI), apoiada pela ONU. “Estamos satisfeitos com o que vemos na maioria dos mercados” em termos de financiamento verde, disse Nathan Fabian, diretor de sistemas sustentáveis do PRI, embora note que a situação nos EUA ainda apresenta desafios significativos. A análise sugere que, apesar dos avanços em algumas áreas, a complexidade da transição climática e energética exige uma abordagem mais focada e realista.
Fonte: Valor Econômico