O cenário profissional mudou significativamente. Se há uma década profissionais com idade entre 55 e 60 anos enfrentavam barreiras para assumir cargos executivos de alto escalão, como presidente, vice-presidente ou diretor, hoje o Mercado demonstra maior abertura. Essa transição reflete o aumento da longevidade e a necessidade de lidar com desafios econômicos complexos, como juros elevados e inflação persistente.
Historicamente, o espaço mais comum para profissionais veteranos era o conselho de administração. No entanto, a perspectiva de pessoas viverem mais e com melhor saúde, aliada a um cenário econômico desafiador, tem impulsionado empresas a reconsiderar e valorizar a experiência de executivos maduros.
Abertura do Mercado para Talentos Seniores
Renata Filippi, sócia da Soul HR Consulting, observa uma redução nas restrições de idade. Em 2015, cerca de 50% das empresas que buscavam altos executivos impunham limites para candidatos entre 55 e 60 anos. Atualmente, essa porcentagem caiu para 30%. Isso significa que 60% dos processos seletivos conduzidos pela consultoria incluem candidatos com mais de 55 anos. “A idade não é mais um critério de seleção”, afirma Filippi, indicando uma mudança paradigmática na Contratação.
Para os profissionais seniores, essa abertura representa a oportunidade de permanecerem ativos, engajados em projetos de seu interesse e com rendimentos que garantem estabilidade financeira. A longevidade crescente torna a Aposentadoria precoce uma escolha cada vez menos comum.
O Caso Nike e a Experiência em Tempos de Incerteza
Um exemplo notório dessa tendência global ocorreu em outubro de 2024, quando a Nike recontratou Elliott Hill, de 60 anos, como CEO. Hill, que havia se aposentado quatro anos antes após mais de 32 anos na empresa, retornou para liderar o Conselho de Administração e o Comitê Executivo. Em suas declarações, Hill enfatizou a capacidade da Nike de superar momentos difíceis através do foco no consumidor, uma estratégia moldada por sua vasta experiência.
Essa recontratação sublinha como a experiência acumulada pode ser crucial em períodos de incerteza. Profissionais com histórico comprovado em superar desafios similares são vistos como ativos valiosos para guiar empresas em cenários complexos.
Cenário Econômico e a Valorização da Experiência
Humberto Wahrhatfig, diretor-executivo da Page Executive, unidade de negócios do PageGroup, destaca que as incertezas econômicas no Brasil, como juros altos, inflação pressionada, tensões comerciais internacionais e conflitos globais, aumentaram a demanda por profissionais experientes em cargos de alta direção.
Para Wahrhatfig, o que se observa é uma crescente procura por executivos que já navegaram por situações desafiadoras. Essa demanda, embora não explicitamente ligada à idade, está indiretamente conectada a ela, pois profissionais mais velhos tendem a possuir esse repertório de experiências.
Empresas buscam, acima de tudo, manter a relevância em seus mercados, e para isso, a expertise de executivos maduros é fundamental. A prioridade passa a ser a sustentabilidade e a adaptação, e não necessariamente um crescimento a qualquer custo.
Exemplos de Sucesso no Mercado Brasileiro
Jose Luiz Gontad, espanhol de 69 anos, exemplifica essa nova realidade. Há dez meses, ele assumiu a responsabilidade pela fábrica de autopeças da Licav em Limeira (SP). Com uma carreira de 37 anos no setor automobilístico, Gontad foi diretor industrial da Itaesbra antes de aceitar o convite da Licav. Ele ressalta a valorização da experiência, da energia positiva e da inovação por parte da empresa.
Gontad, que se cuida com ginástica e terapia, atribui sua disposição ao trabalho à sua geração, que aprendeu a dar mais atenção à saúde. Ele acredita que a experiência acumulada é um diferencial, permitindo-lhe traçar metas ambiciosas, como transformar a Licav em fornecedora direta de componentes para montadoras.
Flexibilidade e Negociação de Remuneração
A contratação de executivos veteranos pode trazer flexibilidade na negociação salarial. Renata Filippi observa que muitos profissionais com quase 60 anos já possuem estabilidade financeira e podem ter mais flexibilidade para aceitar posições com remuneração ligeiramente inferior, sem se desvalorizar.
Embora a desvalorização não seja aceitável, uma diferença de até 15% na remuneração pode ser considerada, segundo Filippi. Wahrhatfig concorda que há uma flexibilidade “ligeira”, mas reitera que esses profissionais prezam pela carreira construída.
Outro ponto de flexibilidade é a menor preocupação com remunerações de longo prazo, como participação acionária, em comparação com profissionais mais jovens. Além disso, a preferência por contratos como Pessoa Jurídica (PJ) reduz encargos trabalhistas para as empresas.
Perfis de Empresas e Setores
Companhias nacionais e familiares tendem a ser mais receptivas a contratar executivos veteranos, muitas vezes pela valorização da experiência por parte dos fundadores e donos. Em contraste, grandes multinacionais, com estruturas de RH voltadas para o desenvolvimento interno de Jovens Talentos, podem ser menos abertas.
Setores como logística, infraestrutura e indústria pesada são os que mais absorvem profissionais com mais de 55 anos para cargos de alta direção. Por outro lado, segmentos mais dinâmicos, como varejo de consumo em massa e mercado financeiro, geralmente preferem executivos mais jovens no alto escalão.
Fonte: Estadão