A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a anulação dos votos proferidos pelos ex-ministros Rosa Weber e Luís Roberto Barroso na ação que discute a descriminalização do aborto.
Ambos os magistrados proferiram votos favoráveis à descriminalização pouco antes de suas aposentadorias, marcando um posicionamento final em relação à causa.
O Julgamento da ADPF 442
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 tem como objetivo determinar se a interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 12 semanas de gestação deve ser considerada crime.
Atualmente, a legislação brasileira permite o aborto apenas em casos de violência sexual, risco de morte para a gestante ou anencefalia fetal. Em seu voto, o ministro destacou a autonomia das mulheres para tomarem suas próprias decisões existenciais.
Argumentos da CNBB
A CNBB alega a existência de vícios procedimentais na condução do julgamento, que, segundo a organização, violam princípios fundamentais como o devido processo legal, o juiz natural, a ampla Defesa e o contraditório. A conferência sustenta que houve supressão do direito de manifestação das partes, da Procuradoria-Geral da República e dos diversos amici curiae habilitados no processo.
A entidade critica o curto prazo para o envio de sustentações orais, que se encerrou no mesmo dia em que a ADPF foi incluída na pauta de julgamento virtual. Além disso, aponta que Rosa Weber inseriu seu voto em uma sessão virtual já encerrada, após um pedido de destaque de Barroso ter levado o julgamento para o plenário físico.
A CNBB também questiona a sessão virtual convocada às pressas pelo presidente Edson Fachin, que permitiu a manifestação de Barroso antes de sua Aposentadoria. A conferência afirma que partes, a PGR e os amici curiae foram novamente impedidos de apresentar sustentação oral.
A organização religiosa criticou o pedido de urgência para a sessão extraordinária, considerando que não havia justificativa plausível para tal, especialmente quando um ministro não relator retira um pedido de destaque sem previsão regimental, ou para incluir um caso em sessão extraordinária apenas por motivo de Aposentadoria iminente. A CNBB ressaltou que este foi um dos poucos casos em que o ministro agiu de forma tão acelerada.
Reações e Posicionamentos
O voto de Barroso gerou descontentamento em setores religiosos. O Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR) já havia solicitado ao ministro Fachin a anulação da participação de Barroso no julgamento, alegando violação do devido processo legal.
O IBDR argumentou que o processo deveria ter sido distribuído por sorteio e não a um magistrado que já havia se posicionado publicamente sobre o tema. O instituto, apesar de reconhecer a idoneidade de Barroso, criticou o fato de o ministro ter apresentado seu voto horas antes de sua Aposentadoria, com o objetivo aparente de impedir que um novo ministro pudesse deliberar sobre uma questão de tamanha magnitude.
O Voto de Barroso
Em sua manifestação, o ministro Luís Roberto Barroso buscou enquadrar a questão sob a ótica jurídica, com foco nos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, ao mesmo tempo em que expressou respeito às doutrinas religiosas contrárias ao procedimento.
Barroso afirmou que direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas e fez a célebre declaração: “Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”.
O ex-ministro ressaltou que sua posição não é a favor do aborto em si, mas contra a criminalização de mulheres que se submetem ao procedimento. Ele argumentou que é possível ser contra o aborto e, ao mesmo tempo, contra a criminalização.
Barroso defendeu ainda que o aborto seja tratado como uma questão de saúde pública, e não de direito penal, pois a criminalização não tem se mostrado eficaz em reduzir o número de ocorrências. Segundo ele, a forma adequada de lidar com o tema é garantir que o aborto seja raro, mas seguro.
O ministro concluiu que a criminalização afeta desproporcionalmente meninas e mulheres pobres, que não têm Acesso a informações adequadas, medicamentos ou procedimentos seguros através do sistema público de saúde.
Fonte: Estadão