Caso Herzog: 50 Anos da Ação Contra a Imprensa e o Divisor de Águas da Ditadura

Caso Herzog: 50 anos da morte do jornalista pela ditadura militar. Ação mirava a imprensa e se tornou divisor de águas contra a repressão.
Caso Herzog 50 anos — foto ilustrativa Caso Herzog 50 anos — foto ilustrativa

Há 50 anos, em outubro de 1975, a professora Carmen Sylvia Vidigal Moraes testemunhou cenas chocantes no DOI (Destacamento de Operações de Informações) do 2º Exército. Relatos de tortura, gritos abafados por Música alta e a confissão de castração de um prisioneiro pintavam um quadro sombrio das operações militares. Ela fazia parte de um grupo de quase cem pessoas detidas sob acusação de ligação com o Partido Comunista Brasileiro (PCB), em uma ofensiva coordenada pelo coronel José Barros Paes, chefe da 2.ª Seção do Estado-Maior do 2.º Exército.

A Operação Contra a Imprensa Comunista

A detenção de jornalistas visava desmantelar organizações ligadas ao partido, utilizando a descoberta da gráfica do jornal Voz Operária como justificativa para ações mais amplas contra a suposta “infiltração comunista na imprensa”. Nomes que já constavam em documentos do órgão, como o do jornalista Rodolfo Konder, passaram a ser alvo. A ofensiva, iniciada em outubro, atingiu profissionais da revista Visão e da TV Cultura, do Governo do Estado.

Entre os dias 10 e 17 de outubro, o repórter Paulo Markun tentou alertar Vladimir Herzog, conhecido como Vlado, sobre o perigo. Herzog, que havia passado pelo Estadão e pela BBC, em Londres, assumira a direção de jornalismo da TV Cultura em 1º de setembro. Apesar dos avisos, Herzog manteve-se em São Paulo, trabalhando.

A Prisão e Morte de Vladimir Herzog

No dia 17 de outubro, uma equipe do DOI deteve Markun e sua esposa. Antes de ser levado, Markun pediu que avisassem Herzog. No dia seguinte, homens do DOI foram à TV Cultura para deter Herzog. Após negociação, o jornalista se apresentou no DOI no dia seguinte, 24 de outubro.

No DOI, Herzog foi despido, obrigado a vestir um macacão de prisioneiro e entregue a Pedro Mira Grancieri, conhecido como Pedro Âncora, responsável pela Seção de Interrogatório. Jornalistas detidos nas celas vizinhas ouviram gritos de dor, choques elétricos e agressões, em um interrogatório brutal.

No início da tarde do dia 25, a notícia de um “acidente de trabalho” se espalhou pelo DOI, revelando a morte de Herzog. A versão oficial, que tentou simular um suicídio por enforcamento, foi posteriormente desmentida. Peritos foram acionados para fraudar um laudo e acobertar o assassinato.

Reações e o Legado do Caso Herzog

A morte de Vladimir Herzog gerou forte comoção. Enquanto o ministro do Exército, Sylvio Frota, era brindado em Brasília, o jornalista Mino Carta confrontou o general Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil, que desmentiu veementemente a versão do suicídio.

O protesto se estendeu para as ruas: 30 mil estudantes da USP entraram em greve. O Exército emitiu nota defendendo a legalidade das prisões, mas a comoção pública foi maior. Mais de mil jornalistas assinaram uma petição exigindo a verdade. O ato ecumênico na Catedral da Sé, com a presença de 8 mil pessoas e a contundente fala do cardeal d. Paulo Evaristo Arns contra o assassinato, marcou o repúdio à violência do regime.

O caso Herzog foi considerado um “divisor de águas”. O coronel Paes admitiu que, após o episódio, a forma de agir dos militares mudou. O que antes era visto como heroísmo passou a ser associado à criminalidade, apesar de se pautar por normas e diretrizes do Exército. Paes, que faleceu em 2023, carregou consigo a pecha de envolvimento, nunca tendo recebido um obituário que mencionasse sua ligação com a farsa do suicídio de Herzog.

A Memória de Herzog permanece como um símbolo da luta pela liberdade de imprensa e contra a repressão, relembrando os 50 anos de um evento que impactou profundamente a história do Brasil.

Fonte: Estadão

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