O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu uma série de medidas para reduzir a letalidade policial no Rio de Janeiro, em julgamento da ADPF das Favelas, ação protocolada pelo PSB em 2019. A decisão voltou à pauta após uma megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha, que se tornou a mais letal da história do Rio, com mais de cem mortos.
O ministro Alexandre de Moraes assumiu temporariamente a condução da ADPF das Favelas no STF, após a Aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso. Moraes determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste em 24 horas sobre o pedido do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) para que o governo do Rio, Cláudio Castro, apresente informações sobre a operação.
O governador Cláudio Castro criticou a ADPF das Favelas, chamando-a de “maldita” e atribuindo ao processo judicial a dificuldade de policiais em combater o crime. Ele argumentou que a ação dificulta a atuação policial, enquanto criminosos utilizam drones com bombas, citando o que chamou de “herança maldita”.

ADPF das Favelas: Histórico e Decisões
A ADPF das Favelas foi apresentada em 2019 pelo PSB, alegando violação massiva de direitos fundamentais no Rio de Janeiro e cobrando um plano para reduzir mortes em operações policiais. Em 2020, o ministro Edson Fachin concedeu liminar para limitar operações a casos “absolutamente excepcionais”, com justificativa e comunicação ao Ministério Público. Essa liminar foi confirmada pelo plenário, que também impôs restrições ao uso de helicópteros e à utilização de unidades de saúde e ensino como bases operacionais.
Em abril deste ano, o STF homologou parcialmente um plano do Estado do Rio para reduzir a letalidade policial. As medidas incluem:
- Elaboração de um plano estadual e municipal para reocupação territorial de áreas dominadas pelo crime, com instalação de equipamentos públicos e políticas voltadas à Juventude.
- Abertura de inquérito pela Polícia Federal para apurar crimes com repercussão interestadual e internacional, em colaboração com forças Estaduais, focando em organizações criminosas e movimentações financeiras.
- Criação de um grupo de inteligência na Polícia Federal, com dedicação exclusiva, para investigar grupos criminosos violentos e suas conexões com agentes públicos, com foco em milícias e lavagem de capitais.
- Comunicação imediata do Ministério Público estadual em casos de mortes de civis ou agentes em decorrência de intervenção policial.
- Ampliação do prazo para 180 dias para a implantação de câmeras nas viaturas da PM e Polícia Civil. Agentes da Civil usarão câmeras em fardas em patrulhamento ostensivo e operações planejadas.
- Observância dos parâmetros da Lei 13.060/2014 quanto ao uso da força, com avaliação do grau adequado de força e proporcionalidade, preferencialmente com planejamento prévio.
- Criação, em 180 dias, de um programa de assistência à saúde mental para profissionais de segurança pública, com atendimento obrigatório após incidentes críticos.
- Criação de um grupo de trabalho coordenado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para acompanhar o cumprimento da decisão e apoiar sua implementação.
Análise Crítica à ADPF das Favelas
A crítica de Cláudio Castro à ADPF das Favelas, de que a ação “deixou a polícia de mãos atadas”, é contestada por dados. Pesquisas indicam uma intensificação de operações policiais desde 2021, com um número crescente de ações e, ao mesmo tempo, menos mortes.
No entanto, o poderio do crime organizado, evidenciado pela recente operação, demonstra que o controle territorial do Estado em áreas urbanas falhou. A mudança na dinâmica do crime, com expansão do Comando Vermelho em áreas antes dominadas por milícias, ocorre paralelamente à vigência da decisão do STF, mas não decorre dela.
A escalada de violência recente pode levar à multiplicação de ações do Comando Vermelho em outras regiões do Rio, buscando desviar o foco das forças policiais da Penha e do Alemão. A operação atingiu a linha de frente da facção, mas não seu centro de comando, indicando que o conflito está longe de um fim.
Fonte: Valor Econômico