A judicialização da medicina tem apresentado um crescimento alarmante, gerando apreensão entre os profissionais de saúde. Em 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) registrou um salto expressivo de 506% no número de processos contra médicos, totalizando 74.358 ações, um aumento significativo em relação aos 12.268 casos do ano anterior.
Desvendando o Aumento Expressivo de Processos
O presidente da Associação Paulista de Medicina, Antônio José Gonçalves, aponta que a Falta de clareza sobre os riscos inerentes aos tratamentos e expectativas irreais, muitas vezes fomentadas por informações distorcidas em redes sociais, são fatores cruciais para essa escalada. A relação de confiança entre médico e paciente tem sido abalada, levando muitos profissionais a adotarem uma ‘medicina defensiva’, priorizando a burocracia em detrimento do cuidado humanizado.
Especialidades Mais Afetadas e Riscos em Procedimentos Estéticos
As especialidades de ginecologia e obstetrícia lideram o ranking de ações no Superior Tribunal de Justiça, representando 42,6% dos casos, seguidas por ortopedia e traumatologia (15,91%) e Cirurgia plástica (7%). Gonçalves destaca que estes casos podem surgir quando o paciente não aceita o resultado de um procedimento médico, como em partos ou cirurgias. Uma ressalva importante é o aumento de complicações sérias, incluindo óbitos, associados a procedimentos estéticos realizados por indivíduos sem a devida qualificação médica, o que coloca a população em risco.
Reflexões sobre a Formação e o Futuro da Medicina
Por ocasião do Dia do Médico, Antônio José Gonçalves propõe uma reflexão sobre os desafios atuais e futuros da profissão. Ele expressa preocupação com a qualidade da formação de novos médicos, citando a proliferação de cursos de medicina com foco excessivo em Lucro, o que pode comprometer a formação. Em menos de dois anos, o MEC aprovou 77 novos cursos, adicionando 4.412 vagas. O Brasil conta hoje com 494 cursos de medicina, sendo 80% privados. A proposta de um Exame Nacional de Proficiência Médica, semelhante à OAB, no Senado, visa avaliar competências e conhecimentos teóricos e práticos.
“O Brasil não precisa de mais médicos, mas sim de melhores médicos”, enfatiza Gonçalves. A medida, já adotada em países como Alemanha e Estados Unidos, permitiria que apenas os aprovados recebessem o registro profissional.
Judicialização da Saúde: Direitos vs. Oportunismo
Embora a judicialização da saúde seja um mecanismo legítimo para Acesso a direitos, Gonçalves alerta para os efeitos negativos quando ações são baseadas em opiniões sem embasamento técnico. “Não podemos permitir ações oportunistas que só visam indenização.” A medicina, por não ser uma ciência exata, exige cuidado para não confundir negligência com resultados negativos ou intercorrências imprevisíveis. A insegurança gerada pela judicialização pode levar a uma medicina defensiva, com a solicitação de exames e procedimentos desnecessários, impactando a relação médico-paciente e elevando os custos do sistema de saúde.
Distribuição Geográfica e Desafios no Interior
Os dados do CNJ revelam que o Sul do país concentrou a maior taxa de processos por mil habitantes no ano passado (5,11), seguido pelo Sudeste (3,12). Em números absolutos, São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia lideram. A desigualdade na distribuição de profissionais é outro ponto crítico. A falta de hospitais capacitados e de professores em cidades menores desestimula os recém-formados, que buscam os grandes centros urbanos. “O futuro da Medicina deve começar agora”, conclui Gonçalves.
Fonte: Estadão