Em tese, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem uma função específica: defender a Constituição Federal de 1988. No entanto, na prática, a nomeação de novos ministros tem se desvirtuado para proteger a linha de ação de quem os indica, especialmente na área criminal. Em última instância, a função do STF pode se resumir a evitar que ex-presidentes vão para a Prisão, o que se tornará a nova tarefa do nomeado, que certamente não será mencionada em seu discurso de posse.
Essa realidade soa absurda, mas tem sido a tônica no Brasil nos últimos anos. A corte tem atuado diretamente em decisões que levaram ex-mandatários ao cárcere ou à sua libertação. Em 2018, por exemplo, o STF rejeitou um habeas corpus, abrindo caminho para o TRF-4 determinar a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no âmbito da Operação Lava Jato.
Reviravolta e Prisão em Segunda Instância
Em 2019, uma reviravolta jurídico-política mudou o cenário. No dia 7 de novembro, o STF considerou a prisão em segunda instância inconstitucional por 6 votos a 5, proibindo o início do cumprimento da pena antes do trânsito em julgado. Lula foi solto no dia seguinte. Em 2021, o Supremo suspendeu a inelegibilidade do ex-presidente por 8 votos a 3, e o caso que o atormentava prescreveu.
Quatro anos depois, muitos desses mesmos ministros participaram do recente julgamento que condenou Jair Bolsonaro em setembro por tentativa de golpe de Estado. Um cenário historicamente confuso.
Razões Políticas na Nomeação de Ministros
Podemos alegar que a Constituição é complexa e sujeita a múltiplas interpretações, ou até falar de pós-modernismo, onde a lógica cede lugar a um grande vale-tudo. Contudo, as razões para os ministros do STF serem nomeados por motivos políticos estão relacionadas ao julgamento do chamado mensalão em 2012. Na ocasião, juízes considerados independentes, nomeados pelo PT, agiram como algozes da sigla, a começar pelo relator, o ministro Joaquim Barbosa. O ex-dirigente José Dirceu acusou o ministro Luiz Fux de trair um acordo para poupar petistas no caso.
O verniz da escolha por notório saber jurídico foi deixado de lado. Ministros passaram a ser vistos como guarda-costas de quem os indicou. A nomeação de Alexandre de Moraes, por exemplo, ocorreu após sua ação contra o hacker que extorquia a família da futura primeira-dama Marcela Temer. Exerceu cargos de secretário de Segurança Pública de São Paulo e ministro da Justiça antes de ingressar no Supremo.
Nomeações sob Bolsonaro e Lula
Jair Bolsonaro nomeou para o STF o ex-AGU André Mendonça, que tem se comportado como aliado, embora possivelmente insatisfeito com o ministro Nunes Marques, que votou pela Permanência de Moraes à frente do inquérito que levou Bolsonaro à prisão.
Lula, em seu terceiro mandato, nomeou seu advogado pessoal, Cristiano Zanin, e o ex-ministro da Justiça Flávio Dino. É difícil formular uma teoria que não considere que se trata de um processo de blindagem.
Lamentam todos que ainda acreditam numa teoria pura do direito, como preconizava Hans Kelsen. A execução da lei seria uma ação objetiva, como ler um manual. Contudo, os jogos de interesse são mais complexos e não comportam erros de cálculo político, onde um equívoco pode resultar em um período no cárcere.
Fonte: Estadão