Congresso Investe R$ 900 Milhões em Máquinas na Amazônia, Ignorando Meio Ambiente

Congresso destina menos de 1% das emendas para o meio ambiente, priorizando mais de R$ 900 milhões em máquinas pesadas para a Amazônia. Entenda o impacto.
Emendas parlamentares meio ambiente — foto ilustrativa Emendas parlamentares meio ambiente — foto ilustrativa

Enquanto a COP30 se aproxima e o Brasil busca destaque internacional em debates ambientais, a realidade orçamentária revela prioridades distintas. Dados do Orçamento federal indicam que o Congresso Nacional destinou menos de 1% das emendas parlamentares para o Ministério do Meio Ambiente ao longo da última década. Em contraste, mais de R$ 900 milhões foram direcionados para a aquisição de 1.648 máquinas pesadas para estados da Amazônia Legal, um montante significativamente superior aos recursos para proteção ambiental na região.

Máquinas pesadas sendo utilizadas em área rural na Amazônia.
Equipamentos pesados, como tratores e escavadeiras, foram amplamente distribuídos na Amazônia Legal.

A Disparidade de Investimentos: Meio Ambiente vs. Maquinário Pesado

A análise do portal Siga Brasil, com base no portal oficial do Orçamento federal, revela que o montante total de emendas parlamentares empenhadas desde 2015, corrigido pelo IPCA, atingiu R$ 298 bilhões. Deste valor, apenas 0,17% (equivalente a R$ 520 milhões) foi destinado à pasta ambiental. É importante notar que a maior parte dessa verba não é focada especificamente na Amazônia Legal, que sediará a COP30 em Belém. As emendas direcionadas explicitamente para a região somam R$ 11,6 milhões, representando apenas 2,2% do total recebido pelo ministério. Em comparação, o Sudeste recebeu cerca de 28% dos recursos, com R$ 147 milhões.

A maior parte dos valores registrados como de âmbito nacional, totalizando quase R$ 272 milhões, foi direcionada ao Ibama e ao ICMBio, principalmente por meio de emendas de relator em 2020. Um levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) aponta que R$ 245,8 milhões foram enviados a outros ministérios como Agricultura, Defesa, Desenvolvimento Regional e Saúde, para ações como o Plano ABC, pesquisas em saúde ambiental e contenção de inundações.

Impactos Ambientais e o Papel das Emendas Parlamentares

A volumosa entrega de máquinas pesadas na Amazônia Legal, incluindo tratores de esteira, escavadeiras e motoniveladoras, ultrapassa os R$ 900 milhões e levanta sérias preocupações. Especialistas, fiscais ambientais e lideranças indígenas associam a disseminação desses equipamentos ao aumento do desmatamento, à abertura de estradas ilegais e à expansão de garimpos clandestinos. O deputado federal Zezinho Barbary (PP-AC) é citado como exemplo de parlamentar que utiliza verbas para regularizar obras de estradas abertas ilegalmente durante seu período como prefeito.

Agentes de fiscalização apontam que o maquinário pode se tornar um instrumento direto para crimes ambientais, como destaca Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama. “A gente percebe uma utilização equivocada, uma utilização ilícita, em muitos lugares esse maquinário é um instrumento do crime”, afirmou, ressaltando que tratores de esteira são usados para derrubar florestas e abrir caminhos para atividades ilegais.

Calha Norte e Codevasf: Emendodutos Controversos

Os principais canais de distribuição dessas máquinas na Amazônia foram o programa Calha Norte e a estatal Codevasf. O Calha Norte, programa militar com 40 anos de existência, entregou 755 equipamentos, tendo sua finalidade original desvirtuada para se tornar um importante canal para emendas parlamentares. Similarmente, a Codevasf, que historicamente focava em projetos de irrigação no Nordeste, expandiu sua atuação para a Amazônia Legal, entregando 440 máquinas.

Ambas as entidades tiveram sua área de atuação expandida para abranger mais municípios de interesse de congressistas. A Codevasf, turbinada por emendas parlamentares durante o Governo Jair Bolsonaro, manteve seu novo perfil e controle por parlamentares do centrão sob o governo Lula. O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional aparece em terceiro lugar, com 265 equipamentos, seguido pelo Ministério da Agricultura, com 188 entregas na região.

Representação de áreas desmatadas e estradas na Amazônia.
A relação entre o maquinário pesado e o aumento do desmatamento e das estradas ilegais na Amazônia é um ponto de atenção.

O Poder das Emendas Parlamentares

A alteração constitucional de 2015, que obrigou o Executivo a pagar as emendas individuais, inaugurou um período de maior controle do Legislativo sobre o Orçamento. Em uma década, o volume de emendas anuais, corrigido, explodiu de cerca de R$ 6 bilhões para aproximadamente R$ 50 bilhões previstos para o ano corrente. Enquanto antes cada parlamentar dispunha de cerca de R$ 16 milhões (equivalente a R$ 26 milhões hoje), agora os deputados têm R$ 38 milhões e os senadores R$ 70 milhões, sem contar emendas coletivas.

Em resposta, a Presidência do Senado, através de nota, afirmou que não emite juízo de valor sobre as escolhas alocativas dos parlamentares, reforçando o compromisso global com a preservação ambiental. A presidência da Câmara dos Deputados não se manifestou sobre o tema, indicando que a questão deveria ser tratada pelas lideranças de comissões orçamentárias.

Fonte: Folha de S.Paulo

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