O fenômeno dos naming rights, a venda de direitos de nome para espaços públicos e privados, está transformando a paisagem urbana brasileira e a forma como as empresas se conectam com o consumidor. Essa estratégia de marketing movimenta bilhões globalmente e tem se tornado cada vez mais popular no Brasil, com Marcas investindo em estádios, estações de metrô, casas de show e até em animais.
Um exemplo curioso envolve a vaca Viatina-19 FIV Mara Móveis, reconhecida pelo Guinness World Records como a fêmea bovina mais cara do mundo. O nome da fazenda foi escolhido em homenagem à empresa de móveis e eletrodomésticos do pecuarista Silvestre Coelho, com o intuito de propagar o negócio principal. Embora não seja possível quantificar o impacto direto nas vendas, a repercussão na mídia e nas redes sociais aumentou a visibilidade da marca.
Estações de Metrô e Trem: Novos Palcos para as Marcas
As estações de trem e metrô se tornaram alvos preferenciais para a consolidação de autoridade de marca. Em São Paulo, por exemplo, 11 estações já possuem contratos de naming rights vigentes. Essa iniciativa visa não apenas arrecadar fundos para as concessionárias de transporte, mas também aproximar as empresas do cotidiano dos consumidores.
A estação Berrini, da Linha 9 – Esmeralda, agora se chama Casas Bahia. A varejista, além de patrocinar a estação, instalou elementos visuais customizados e realizou ações no entorno. Gustavo Pimenta, diretor executivo comercial e de marketing da Casas Bahia, explica que a ideia é estar presente na rotina das pessoas e cravar a marca na cabeça do consumidor que frequenta a região, tornando-a algo perene.
Outros exemplos incluem a estação Jardim Silveira, da Linha 8-Diamante, nomeada pela distribuidora de materiais para marcenarias Leo Madeiras. Nicolai Mariano, diretor de Operações da Leo Madeiras, destaca que a iniciativa gera orgulho e pertencimento, especialmente porque muitos colaboradores da empresa utilizam essa estação.
A História dos Naming Rights: De Credicard Hall a Vibra São Paulo
A prática de associar nomes de empresas a locais não é nova. A casa de shows Vibra São Paulo, inaugurada em 1999 como Credicard Hall, passou por diversas mudanças de nome (Citibank Hall, UnimedHall) até se tornar Vibra São Paulo com o patrocínio da Vibra Energia. Essa mudança foi parte de uma estratégia de rebranding da companhia após a descontinuação do nome “BR Distribuidora”.
Fernanda Galluzzi, sócia e VP de negócios da agência anacouto, ressalta que o naming right é uma ferramenta poderosa para criar conexão emocional e engajamento, transformando o nome da empresa em parte do vocabulário cotidiano. Ela explica que vincular um nome a um espaço de grande relevância reforça atributos de identidade e reputação da marca.
Luiz Calainho, sócio-diretor de marketing e negócios da Aventura, complementa que a aquisição de naming rights deve ser vista como o início de um relacionamento de longo prazo com o público, funcionando como uma plataforma de comunicação. Ele cita exemplos como o BTG Pactual Hall e o Teatro YouTube, demonstrando o potencial dessa estratégia.
Eventos Esportivos e o Crescimento do Mercado
O mercado de naming rights no Brasil tem visto um crescimento expressivo, especialmente em eventos esportivos. Um dos maiores acordos recentes é o contrato de mais de R$ 1 bilhão entre o Mercado Livre e a concessionária Allegra Pacaembu, que batizou o complexo como Mercado Livre Arena Pacaembu. A parceria visa posicionar o e-commerce no setor de entretenimento, com o espaço de eventos chamado Mercado Pago Hall.
Thiago Savoldi, diretor de marketing da Allegra, explica que a escolha do Mercado Livre foi estratégica, baseada em estudos de público e comportamento de consumo. O contrato, com duração prevista de 30 anos, prevê diversas ações de fortalecimento de marca, como a mediação de todas as transações financeiras pela maquininha do Mercado Pago.
Outros exemplos notáveis incluem o Allianz Parque, Neo Química Arena, Arena MRV e o trocadilho MorumBIS para o Estádio Cícero Pompeu de Toledo, resultado de um acordo de R$ 75 milhões com a Mondelez Brasil (Bis). Tom Gil, head de atendimento da agência David, destaca que o MorumBIS não apenas legitimou a presença da marca Bis no futebol, mas permitiu a criação de uma narrativa única.
Desafios e Críticas: Sociedade e Urbanismo
Apesar dos benefícios econômicos, os naming rights também geram debates e críticas, principalmente em relação ao impacto na paisagem urbana e à memória coletiva. Cristina Wehba, arquiteta e urbanista, expressa preocupação com a comercialização de nomes de equipamentos públicos, argumentando que isso pode levar à privatização da memória e a uma distorção da identidade urbana.
Ela critica o contrato do Pacaembu, que, segundo ela, desrespeita a Lei Cidade Limpa e privilegia o interesse privado em detrimento do público, com uma participação mínima da receita para o poder público. A inclusão do nome “Mercado Livre” antes de “Pacaembu” é vista como uma distorção que deveria preservar o nome original do equipamento público.
Marcelo Ignatios, assessor de projetos especiais do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo, concorda que a nomeação de espaços públicos por agentes privados pode gerar a sensação de privatização de um local coletivo, distorcendo a Lei da Cidade Limpa, que visa reduzir a poluição visual.
O Metrô de São Paulo, por sua vez, defende a concessão de naming rights como uma estratégia para melhorar a experiência do passageiro e gerar receitas não tarifárias, aplicadas na manutenção e operação do sistema. O processo é feito por licitação pública, com a marca vencedora adicionada como um “sobrenome” à estação, preservando o nome original.
A CPTM também está prospectando o mercado em busca de oportunidades de naming rights para suas estações e para o Expresso Turístico, visando gerar receita adicional e parcerias estratégicas.
Fonte: Estadão