Coelho Neto: A Luta de um Gênio Literário Contra a Fome e a Escassez

Descubra a história de Coelho Neto, o “Príncipe dos Prosadores Brasileiros”, que enfrentou a fome para escrever e conquistar leitores com seus folhetins sem psicologia.
Coelho Neto — foto ilustrativa Coelho Neto — foto ilustrativa

A dificuldade em viver apenas da escrita é uma realidade persistente no Brasil, uma nação com um público leitor aquém do potencial. A renomada escritora Lygia Fagundes Telles, com quem tive a honra de conviver por décadas, frequentemente lamentava os baixos Direitos Autorais que recebia, apesar de ser uma das maiores romancistas brasileiras e constante cotada para o Nobel de Literatura.

A história de muitos intelectuais que se dedicaram às letras no Brasil é marcada por lutas para manter um padrão mínimo de dignidade, enfrentando frequentemente situações dramáticas por falta de recursos financeiros. Nomes que merecem destaque no panteão da literatura brasileira encontraram obstáculos que autores de nações mais desenvolvidas considerariam tramas de ficção.

A Oportunidade em Meio à Dificuldade

Coelho Neto, um desses escritores que vivia às voltas com Finanças exíguas, buscou trabalho na “Gazeta de Notícias”, então dirigida por Ferreira de Araújo. Inicialmente, foi dissuadido, pois não havia uma vaga clara para ele. O desafio era substituir o autor dos populares folhetins que impulsionavam as vendas do jornal.

“Seus problemas acabaram! Eu faço o folhetim!”, propôs Coelho Neto. Ferreira de Araújo, conhecendo seu estilo, hesitou: “Tens muitas psicologias… E um folhetim tem de ser principalmente ação e intriga, para despertar a atenção e o interesse do público do jornal”.

Determinado a garantir seu sustento, Coelho Neto insistiu: “Se é assim que desejas, será feita a tua vontade. Farei o folhetim sem psicologias!”. Ferreira de Araújo, após um período de reflexão, cedeu.

Da Necessidade à Criação Literária

Coelho Neto, mesmo já conhecido por obras como “Inverno em flor”, enfrentava dificuldades financeiras e estava disposto a aceitar qualquer oferta, inclusive pagamento em moeda. Comovido, Ferreira de Araújo decidiu contratá-lo e pediu um título para a obra.

A sugestão inicial de Coelho Neto, “O Príncipe Encantado?”, foi rejeitada por cheirar a algo antigo. “O Rajá de Pendjab!” foi a alternativa escolhida, com a exigência de o primeiro texto estar pronto para o dia seguinte. Coelho Neto aceitou o desafio com entusiasmo.

Naquela época, a produção jornalística era em grande parte manual, com manuscritos e composição tipográfica realizada por linotipistas, um processo inimaginável para as gerações atuais.

No dia seguinte, a “Gazeta de Notícias” anunciou em sua primeira página o folhetim, creditado a um “romancista francês”, acompanhado pela imagem de um idoso barbudo, que na verdade era o autor de um famoso “remédio milagroso” da época, o velho Humphreys.

O Legado de um “Príncipe dos Prosadores”

Coelho Neto conseguiu se manter durante aquele período, criando tramas envolventes e conquistando leitores, enquanto seguia escrevendo sua obra literária. Henrique Maximiano Coelho Neto, nascido em Caxias, Maranhão, em 1864 e falecido no Rio de Janeiro em 1934, é lembrado como fundador da Cadeira número 2 da Academia Brasileira de Letras.

Foi aclamado como “Príncipe dos Prosadores Brasileiros” em votação realizada em 1928 pela revista “O Malho”. Em seu gabinete de trabalho, admirava bustos de Eça de Queiroz e Camilo Castelo Branco, escritores portugueses que o inspiravam profundamente. Ao ser questionado sobre sua preferência, respondia: “Cada vez me apaixono mais pelo estudo da língua. E, especialmente, da língua em Camilo!”. Para ele, “Eça tem a minha admiração. Camilo é a minha religião!”.

Este talentoso escritor, devoto da “última flor do Lácio”, produziu folhetins para garantir sua subsistência, exemplificando as dificuldades enfrentadas pela literatura em um Brasil onde ser autor era, muitas vezes, um ato de heroísmo e idealismo.

Fonte: Estadão

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