A Câmara dos Deputados aprovou em tempo Recorde a Medida Provisória 1304, que altera regras no setor elétrico. O texto, relatado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), incluiu uma medida que, apesar de recuar na contratação de termelétricas a gás em regiões sem o combustível, beneficia o empresário Carlos Suarez, apelidado de “Rei do Gás”.

Originalmente, o governo buscava impulsionar a Contratação de termelétricas a gás em Estados onde o combustível não é abundante, o que favoreceria distribuidoras das quais Suarez é sócio. No entanto, após um acordo com o governo Lula, essa parte específica foi retirada. Em contrapartida, o senador Braga introduziu uma nova fonte de financiamento para a construção de gasodutos, que pode viabilizar indiretamente os negócios do empresário.
Financiamento para Gasodutos Viabiliza Negócios do ‘Rei do Gás’
Apesar do revés inicial, o empresário viu uma segunda medida ser incorporada à MP, com potencial para impulsionar seus empreendimentos. A assessoria de Eduardo Braga destacou que a destinação de recursos do fundo do petróleo para obras de infraestrutura é uma iniciativa do Executivo, acolhida pelo relator e que obteve consenso parlamentar por seu caráter estratégico. O objetivo, segundo Braga, é sanar gargalos de infraestrutura, destravar investimentos e ampliar a capacidade energética nacional, com um processo conduzido por meio de leilões públicos técnicos e competitivos.
Em discurso no dia da votação, o senador enfatizou que recursos do Fundo Social do pré-sal serão direcionados para financiar a infraestrutura de escoamento de gás, que também pode beneficiar a fabricação de fertilizantes, reduzindo a dependência de importações. “Não é só para energia. Nós importamos US$ 14 bilhões por ano de fertilizantes”, afirmou.
Uso de Recursos do Fundo Social do Pré-Sal
O texto aprovado pela Câmara e pelo Senado permite que verbas do Fundo Social do pré-sal financiem a construção de gasodutos. Essa infraestrutura é crucial para transportar o gás da costa até estados do interior, onde Suarez possui participação em distribuidoras de gás, mas onde ainda não há oferta local. Essa medida, que não constava na versão original da MP enviada pelo Governo, pode viabilizar a chegada do combustível e, consequentemente, tornar economicamente viáveis as termelétricas a gás nessas regiões.
Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, comentou que essa iniciativa representa uma forma do governo desembolsar recursos do Orçamento para políticas públicas sem impactar o resultado primário, um “truque” que o Congresso agora também busca replicar. Essa estratégia de utilizar o Fundo Social para financiar infraestrutura pública já foi tentada anteriormente, mas não avançou. Agora, a decisão sobre sancionar ou vetar a medida cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A MP aprovada determina que o superávit do Fundo Social poderá servir como fonte para bancos estatais utilizarem em linhas de crédito para a infraestrutura de gás natural. As instituições financeiras assumirão o risco de crédito dessas operações. Criado em 2010, o Fundo Social do pré-sal visava ser uma poupança para futuras gerações com a Receita do petróleo, mas tem sido cada vez mais utilizado para financiar políticas públicas e contornar limitações fiscais. Recentemente, o Congresso autorizou seu uso para projetos de infraestrutura social, habitação popular e ações em calamidades públicas.
Contexto da Privatização da Eletrobras e as Termelétricas a Gás
O projeto de privatização da Eletrobras, em 2021, incluiu uma emenda que exigia a contratação compulsória de 8.000 MW de energia gerada a gás natural como “energia de reserva de capacidade”. O objetivo era mitigar o risco das oscilações das fontes renováveis, como eólica e solar. A determinação de localização das usinas em estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste coincidia com as áreas onde Carlos Suarez detém participação em distribuidoras de gás, mas sem oferta local.
O entrave para Suarez era um “preço-teto” para a contratação dessa energia, baseado em um leilão de 2019 e corrigido pela inflação, o que tornava o negócio inviável devido aos custos de transporte do gás. O primeiro relatório do senador Eduardo Braga previa a contratação obrigatória de gás sem preço-teto, o que foi visto pelo setor elétrico como uma forma de viabilizar as usinas. Contudo, após pressão do setor e do governo, Braga precisou recuar da obrigatoriedade de contratação, o que foi visto como um revés para o empresário.
Apesar disso, a permissão para a construção de gasodutos com recursos do fundo do petróleo permaneceu no texto. Isso pode, por si só, viabilizar a chegada do combustível aos estados e permitir que as termelétricas ofereçam energia a preços competitivos, tornando o negócio viável mesmo sem a contratação compulsória.
Fonte: Estadão