Mendonça de Barros: Judiciário e Legislativo precisam aceitar a realidade fiscal

José Roberto Mendonça de Barros alerta que Judiciário e Legislativo precisam aceitar a realidade fiscal para permitir o ajuste das contas públicas no Brasil.
ajuste fiscal Brasil — foto ilustrativa ajuste fiscal Brasil — foto ilustrativa

O economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica e sócio-fundador da consultoria MB Associados, expressou otimismo cauteloso quanto à capacidade do Brasil de ajustar suas contas públicas no próximo governo. Segundo ele, um consenso crescente entre analistas aponta para a gravidade do problema fiscal, sinalizando que o país não conseguirá progredir com um quadro financeiro desequilibrado.

“Nós estamos chegando a um momento em que a ampla maioria dos analistas diz que, com o peso de um grande problema fiscal, não tem jogo de crescimento, tem jogo de andar de lado”, afirmou Mendonça de barros. Ele ressaltou que esse consenso, embora ainda incompleto, é fundamental para impulsionar mudanças na política econômica e nas políticas públicas.

Necessidade de Consenso entre os Três Poderes

Mendonça de Barros destacou que o próximo presidente terá o desafio de construir esse consenso fiscal, envolvendo ativamente o Judiciário e o Legislativo. “Nós não vamos resolver um ajuste fiscal se não tivermos os três poderes trabalhando, de alguma forma, numa mesma direção. Não é que façam as mesmas coisas e que tenham as mesmas ideias, mas têm de aceitar, pelo menos, o princípio de que não se cria recurso do nada”, disse o economista.

José Roberto Mendonça de Barros em entrevista sobre a situação fiscal do Brasil
José Roberto Mendonça de Barros em entrevista sobre a situação fiscal do Brasil.

Desafios Fiscais e a Perspectiva Otimista

O economista explicou que o cenário atual apresenta um consenso significativo sobre a existência de um problema fiscal substancial, um avanço em relação a anos anteriores. Ele vê otimismo na forma como a sociedade e os analistas têm encarado a questão, reconhecendo que um quadro fiscal desequilibrado impede o crescimento econômico.

“Em várias áreas, o Brasil só forma consensos quando o problema fica realmente muito grave. E a história está cheia de elementos, a começar pela própria inflação. Teve de haver a hiperinflação para que toda a sociedade dissesse que não tem jogo com a inflação”, comparou Mendonça de Barros, indicando que o problema fiscal pode atingir um ponto semelhante de reconhecimento social.

O Papel do Judiciário e do Legislativo

Mendonça de Barros criticou a postura de parte do Judiciário, que, segundo ele, ainda defende privilégios salariais e remuneratórios extraordinários, e toma decisões com alto impacto fiscal sem considerar a capacidade de pagamento do setor público. “O Judiciário, como um todo, em número de decisões judiciais de primeira e segunda instâncias que manda o setor público pagar isso, pagar aquilo, sem a menor consideração sobre qual o sentido disso, é espantoso.”

Em relação ao Legislativo, especialmente a Câmara dos Deputados, ele apontou um foco excessivo em emendas, benefícios e gastos, além da influência de lobbies. “Eles têm, sim, uma participação decisiva nesse desastre e nessa piora. Mais evidente ainda é votar a despesa que não tem origem na Receita“, declarou.

Propostas para o Ajuste Fiscal

Para Mendonça de Barros, o próximo presidente terá a missão de gerar superávits primários consistentes e críveis, com um objetivo anual médio de 2% do PIB. Ele sugere que o ajuste fiscal deve ser construído gradualmente, com metas persistentes para estabilizar a dívida pública. “Uma lista de desejos sem viabilidade política não se materializa e, portanto, não se faz o ajuste fiscal.”

Entre as medidas necessárias, o economista mencionou a revisão de regras de reajuste de benefícios, como o seguro-desemprego e o seguro-defeso, além de ajustes nos pisos de saúde e educação. Ele também defende a revisão de empresas estatais ineficientes, citando os Correios como exemplo, e a necessidade de reformas na Previdência e na administrativa.

Riscos da Inércia Fiscal

O economista alertou que a inércia fiscal pode levar a um cenário de estagflação, com a combinação de juros reais altos e estagnação econômica. Embora acredite que o Brasil tenha pouco risco de retornar a um quadro de inflação alta devido ao aprendizado recente, ele considera a possibilidade de juros elevados persistirem, prejudicando o crescimento.

Mendonça de Barros avalia que, mesmo em um cenário de reeleição, o Governo precisará encarar o ajuste fiscal, pois a conta ficará cara para o país. Ele pondera que um ministro como Fernando Haddad pode ter essa percepção, mas expressa dúvidas sobre a disposição do presidente em priorizar um ajuste fiscal ambicioso.

Agenda de Reformas

O economista defende a revisão de regras do arcabouço fiscal e a necessidade de complementar a reforma da Previdência, com foco na idade mínima e na equiparação dos militares. Ele também sugere a revisão da reforma trabalhista, atualmente impactada por decisões judiciais.

Para Mendonça de Barros, a agenda do país é extensa e requer um planejamento plurianual. Ele enfatiza que a persistência em metas fiscais, mesmo que modestas no curto prazo, como um superávit primário de 2% do PIB, é mais eficaz politicamente do que a busca por objetivos ambiciosos e irrealizáveis.

Fonte: Estadão

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