A recente reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump em Kuala Lumpur trouxe um sopro de otimismo para exportadores brasileiros e economistas, especialmente após a imposição de tarifas de 50% sobre produtos nacionais pelos Estados Unidos há quase três meses. A conversa de 45 minutos, ocorrida em privado, sinalizou um avanço nas negociações para a reversão ou mitigação dessas sobretaxas.
Em suas redes sociais, o presidente Lula indicou que as discussões sobre o fim do “tarifaço” iniciaram imediatamente após o encontro. Ele solicitou a Trump um senso de urgência e o envolvimento de suas equipes nas tratativas, visando a revisão da taxação e das sanções aplicadas a autoridades brasileiras. Embora Trump não tenha decidido de imediato, ele autorizou o início de diálogos entre os ministros das áreas pertinentes.
Agronegócio Brasileiro Espera Respostas Rápidas
Representantes do agronegócio brasileiro demonstram grande expectativa quanto ao desenrolar das negociações. O setor, um dos mais impactados pelo aumento das tarifas, aposta em uma resolução célere, possivelmente com um acordo bilateral nas próximas semanas. A ampliação da lista de produtos brasileiros isentos das tarifas é vista como uma possibilidade mais imediata do que a remoção completa da sobretaxa de 40%.
O café, em particular, surge como um candidato forte para a isenção. Sua produção é inexistente nos Estados Unidos, o que o torna um item de maior flexibilidade para os americanos. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), Pavel Cardoso, expressou otimismo, destacando a importância cultural e econômica do café nos EUA, um Mercado que movimenta US$ 343 bilhões anualmente. A Abic estima que as tarifas sobre o café já causaram um aumento de 16% no preço da commodity no varejo americano, e a manutenção dessas taxas agravaria a inflação de alimentos no país.
Setores como o de carne bovina, apesar de terem registrado recordes de exportação em setembro ao direcionar vendas para outros mercados, celebram a reaproximação. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) acredita que o entendimento entre os governos pode preservar a competitividade do produto brasileiro e garantir previsibilidade aos exportadores.
Pescados Buscam Prioridade nas Negociações
Para os produtores de peixe, o alívio pode ser ainda mais significativo, dada a menor flexibilidade de fornecimento para outros mercados. O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca), Eduardo Lobo, ressaltou a importância do passo dado pela conversa entre os presidentes, mas também a necessidade de o Brasil definir suas prioridades nas negociações. O setor estima uma perda de US$ 300 milhões em exportações este ano devido às tarifas, com o mercado europeu apresentando barreiras há mais de uma década e outros mercados asiáticos, árabes e australianos pagando menos.
Terras Raras e Interesses Econômicos Norte-Americanos
O professor de Relações Internacionais da ESPM, José Luiz Pimenta, vê a reunião como o início de uma etapa formal de negociação, onde o Brasil já apresentou suas demandas e os EUA deverão expor suas contrapropostas. Ele destaca que o peso político das tarifas pode ter dado lugar a considerações econômicas, tanto para o Brasil quanto para os EUA, que buscam garantir o fornecimento de produtos com preços em alta. Um ponto estratégico mencionado por Pimenta é a agenda de terras raras. Com as restrições da China, os EUA buscam diversificar fornecedores, e o Brasil emerge como um ator estratégico nesse segmento.
O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, compartilha a visão de que a guerra tarifária agora se baseia em negociações mais razoáveis, com foco em interesses americanos como as terras raras. Ele sugere que as decisões iniciais de Trump podem ter sido baseadas em informações equivocadas e que uma distensão tarifária é provável, embora Trump deva manter uma postura ativa em disputas comerciais globalmente.
Em uma perspectiva mais conservadora, o economista André Perfeito pondera que, apesar do sucesso do encontro, as tarifas não devem ser drasticamente reduzidas. Ele aponta que as transações correntes nos EUA são um problema central não totalmente abordado. Perfeito, contudo, não descarta ganhos para o Brasil, como investimentos na exploração de terras raras. Ele também ressalta a preocupação com o déficit em transações correntes brasileiro, que atingiu US$ 79 bilhões nos últimos 12 meses até setembro, e a urgência em estabilizar a questão fiscal, crucial para a confiança econômica e para as expectativas sobre a taxa Selic.
Fonte: Estadão